A madeira é um material de construção ancestral, mas está recebendo uma nova atenção, especialmente com o surgimento da madeira engenheirada. Esse grupo de produtos oferece a possibilidade de, em vez de extrair os materiais brutos para nossos prédios e cidades da terra, cultivá-los, capturando gases de efeito estufa que aquecem o clima no processo. Mas será que a madeira é sempre benéfica para o meio ambiente? Ou é simplesmente menos prejudicial do que materiais à base de minerais, como concreto e aço?
Responder a essas perguntas está longe de ser simples, mas começa com o local onde a madeira é cultivada. Gerenciar uma floresta de forma sustentável envolve equilibrar a produtividade com a proteção dos corpos d’água, preservação do habitat da vida selvagem e consideração do carbono e do clima. “Uma silvicultura exemplar é uma visão holística desses três aspectos”, explica Jennifer Shakun, diretora da Iniciativa de Bioeconomia da New England Forestry Foundation, uma organização de conservação fundiária.
Uma ferramenta que pode ajudar a determinar se um produto de madeira originou-se de uma floresta desse tipo são as certificações. Os rótulos de certificação de madeira mais dominantes na América do Norte são aqueles administrados pelo Forest Stewardship Council (FSC) e pelo Sustainable Forestry Initiative (SFI). Esses programas levam em consideração fatores como o tamanho dos desmatamentos, os níveis de retenção de árvores vivas, o uso de pesticidas e a proteção de espécies ameaçadas. Dos dois, o FSC é considerado mais rigoroso, sendo que as práticas aprovadas pelo SFI são equivalentes ao que as regulamentações do Canadá e dos Estados Unidos já exigem. “O FSC é mais abrangente”, diz Amy Leedham, líder de práticas de carbono nos Estados Unidos da consultoria de sustentabilidade Atelier Ten. “Ele aborda mais critérios com maior profundidade”, afirma. No entanto, há um problema: produtos certificados FSC nem sempre estão disponíveis, e o processo de certificação pode ser caro, o que torna difícil para pequenos proprietários de terras e florestas gerenciadas por comunidades indígenas obterem a certificação.
As melhores práticas de manejo promovem ecossistemas florestais que sequestram mais carbono. No entanto, estimar a quantidade de carbono biogênico em um determinado produto de madeira é complicado. Uma razão para isso é que a maioria dos calculadores de avaliação do ciclo de vida (ACV) – ferramentas que quantificam os impactos ambientais de produtos manufaturados – usa conjuntos de dados nacionais que não levam em conta a ampla variação de práticas em florestas individuais. “Com as ferramentas atuais de ACV, é difícil entender as suposições subjacentes”, diz Jacob Dunn, arquiteto associado da ZGF. Em colaboração com o Consórcio de Pesquisa Aplicada da Universidade de Washington, a empresa está tentando remediar essa situação por meio de sua ferramenta UpStream Forestry Carbon & LCA. Atualmente em teste beta público, o calculador de código aberto tem como objetivo tornar os dados subjacentes transparentes e fáceis de manipular. “A ideia é ajudar os projetistas a entender melhor as dinâmicas entre as florestas e os produtos de madeira que delas derivam”.
Dadas as limitações atuais, uma das melhores maneiras para os arquitetos terem controle sobre a origem dos produtos de madeira que estão especificando é trabalhar diretamente com os fabricantes, fazendo-lhes perguntas detalhadas. Por exemplo, a equipe por trás do COB3, um edifício de escritórios de madeira engenheirada projetado pela SOM, com um valor de 230 milhões de dólares, localizado no Condado de San Mateo, Califórnia, avaliou possíveis fabricantes para os painéis de piso em madeira laminada cruzada (CLT) do edifício. Eles pesquisaram a capacidade dos fabricantes em relação ao tamanho dos painéis e às limitações de capacidade de carga, mas também investigaram suas cadeias de suprimentos. O fabricante selecionado estava a menos de dois quilômetros da floresta onde a madeira foi colhida e era vizinho a outra fábrica que produzia painéis de fibra a partir de sobras de CLT.
Cada vez mais equipes de projetos estão adaptando o processo de obtenção de madeira para refletir as prioridades de seus clientes. A LEVER Architecture, sediada em Portland, Oregon, fez exatamente isso no projeto de sede da Meyer Memorial Trust, uma organização de concessão de subsídios. Com um custo de 10,8 milhões de dólares e 1.840 metros quadrados, o edifício foi concluído em 2020 no bairro Lower Albina, em Portland. Possui um telhado em forma de serra e seus componentes estruturais são fabricados principalmente em madeira compensada maciça – um painel de engenharia em grande escala feito de folheados de madeira. O edifício também incorpora vários outros produtos de madeira, incluindo treliças de telhado, pisos e tetos. Para a Meyer, o processo de construção e a aquisição desses materiais representaram uma oportunidade de avançar em sua missão de justiça racial, social e econômica, especialmente em Oregon.
A Meyer trabalhou com a organização sem fins lucrativos Sustainable Northwest para desenvolver diretrizes de aquisição que foram além dos processos florestais e de fabricação, considerando também a proximidade do fornecedor em relação ao local, a propriedade de empresas de pequeno porte, e o custo. O prêmio por essa estratégia foi insignificante, totalizando menos de $25.000, ou cerca de três por cento do pacote de madeira no valor de $745.000. No entanto, o investimento modesto teve um impacto desproporcional. Das 12 categorias de produtos de madeira utilizados no edifício, 10 foram cultivados e fabricados em Oregon. Empresas de propriedade de minorias estiveram envolvidas na compra e instalação de seis dessas categorias, enquanto pequenas empresas foram responsáveis por sete. Nove dos produtos foram provenientes de florestas consideradas ecologicamente gerenciadas. O projeto influenciou locais além do próprio edifício, afirma Thomas Robinson, fundador da LEVER.
A reforma do principal terminal do Aeroporto Internacional de Portland é outro projeto com critérios de obtenção personalizados, mas que leva essa abordagem a uma escala totalmente nova. Projetada pela ZGF, a expansão de $1,8 bilhão, apresenta um telhado sinuoso de mais de 35.000 metros quadrados construído com mais de 800.000 metros de tábuas de madeira laminada colada e 37.000 metros quadrados de painéis de madeira compensada maciça. Para o proprietário do terminal, a Port of Portland, transparência e rastreabilidade eram essenciais. “Eles queriam conhecer a história local da madeira”, diz Dunn. “Queriam saber quem era o proprietário da terra e como eles a estavam administrando”, acrescenta.
Praticamente todos os produtos de madeira utilizados no terminal podem ser rastreados até proprietários de terras individuais e serrarias em Oregon e no estado de Washington, ou são certificados pelo FSC. Grande parte da madeira tem origem em florestas de propriedade familiar ou em terras tribais do noroeste do Pacífico. Cerca de 112.000 metros de madeira laminada colada vieram das florestas da Nação Yakama, para quem a terra tem importância espiritual e cultural, além de ser fonte de água, alimentos e receitas. As práticas de manejo florestal da tribo incluem o desbaste a partir de baixo para preservar as árvores maiores e mais saudáveis, amplas faixas de proteção ao redor dos cursos d’água e áreas protegidas onde não é permitida a colheita. Tais proprietários “têm uma relação fundamentalmente diferente com a terra em comparação com operações industriais de grande porte”, diz Dunn.
Mesmo quando a madeira vem de florestas exemplares, ainda é crucial que ela seja utilizada de forma cuidadosa, afirmam especialistas em madeira. A SRG Partnership descobriu o quão crítico pode ser o uso prudente da madeira no Edward J. Ray Hall, um edifício de laboratórios e salas de aula de 4.600 metros quadrados, no valor de $49 milhões, projetado pela empresa de arquitetura com sede em Seattle, na Universidade Estadual de Oregon-Cascades, em Bend. Concluída em 2021, a estrutura de madeira engenheirada de quatro andares inclui pilares e vigas de madeira laminada colada, pisos de madeira compensada maciça com lajes de concreto e núcleos de concreto. Os esquemas iniciais foram baseados em um espaçamento de colunas de 4 metros. No entanto, por meio de uma análise extensa, foi determinado que reduzir essa distância resultaria em economia significativa de materiais. Um espaçamento de colunas de 3 metros, o que foi construído, permitiu o uso de menos camadas de madeira compensada maciça, o que, por sua vez, possibilitou vigas mais rasas, resultando em uma redução de 25% na fibra de madeira. Embora os arquitetos não tenham quantificado o carbono incorporado nos dois projetos, é lógico concluir que o espaçamento mais próximo produziu economias significativas, uma vez que também permitiu uma redução de 3% no concreto e uma redução geral de 10% na massa do edifício. Vale ressaltar que isso reduziu em $3 o custo de construção por metro quadrado. “A análise destaca a importância do pensamento em sistemas integrados”, diz Lisa Petterson, principal responsável da SRG.
Usar madeira de forma sábia também inclui considerar o que acontecerá com o material uma vez que a estrutura tenha atingido o fim de sua vida útil. Os especialistas afirmam que os prédios devem ser projetados de forma a aumentar as chances de reutilização dos componentes, em vez de descartá-los. No COB3 da SOM, detalhes foram incorporados para reduzir a probabilidade de que seus componentes acabem em aterros sanitários, onde liberariam seu carbono armazenado na atmosfera. Isso inclui conexões de aço na base de cada coluna de MLC no prédio em forma de H, de cinco andares. Segundo Eric Long, engenheiro estrutural e sócio da SOM, suas barras roscadas e porcas podem ser desparafusadas, se necessário.
Outros recursos do COB3 foram projetados para evitar sua obsolescência. O edifício antecipa mudanças, com espaços estruturais projetados para acomodar uma variedade de configurações de escritórios abertos ou fechados. Perfurações pré-cortadas nas vigas do prédio, que em grande parte permanecerão expostas, devem permitir a instalação da infraestrutura necessária, independentemente do layout do espaço de trabalho, incluindo iluminação, sistemas mecânicos e sprinklers. “O futuro foi incorporado desde o primeiro dia”, diz a arquiteta Francesca Oliveira, sócia da SOM.
A estratégia voltada para o futuro do COB3 demonstra a relevância do projeto na abordagem das questões climáticas e como as decisões tomadas agora, a começar pela floresta, mas se estendendo à estrutura do prédio, podem afetar o futuro. “A realidade é que nossas escolhas têm um impacto”, diz Robinson, da LEVER. Os arquitetos precisam estar cientes disso, projetando levando em consideração a paisagem de materiais em geral. “É um papel que os arquitetos devem desempenhar”.
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Por Joann Gonchar, via Architectural Record