Um novo tipo de turismo ganha força em Milão. Um turismo que foge dos tradicionais roteiros históricos e culturais, mas nem por isso menos interessante e intrigante. Afinal, a metrópole, conhecida como a locomotiva econômica da Itália, é a capital do design internacional. “Milão é, com certeza, a casa do design”, reafirma Luca Martinazzoli, diretor geral da Milano&Partners, responsável pela nova campanha publicitária lançada no site Yes Milano, que oferece passeios temáticos aos turistas. “Durante a Milano Design Week, de 18 a 23 de abril deste ano, divulgamos o itinerário ‘Milano Home of Design’, justamente para enfatizar que a cidade é a capital do design e não só durante o Salão do Móvel, mas o ano todo”.
E os números comprovam. O turismo focado no design e arquitetura vem atraindo, ano após ano, turistas do mundo todo, principalmente após a pandemia. No ano passado, Milão demonstrou ter sido uma das metas de viagem mais procuradas no país com 6,7 milhões de pessoas, somente 10% a menos em relação a 2019, ano recorde para o turismo milanês, segundo dados fornecidos pela Secretaria de Turismo da cidade. Vale lembrar que 60% desse número se refere aos visitantes que passam pela cidade por turismo, não a negócios.
A pergunta porém é: o que Milão tem de extraordinário? “Tudo”, responde a paulistana Cyntia Temer Massari, 57 anos, que há quase dez anos trabalha com guias e profissionais especializados organizando roteiros “sob medida” com foco no design e na moda através da sua agência Vivendo Milão. “É uma cidade para ser descoberta. Pode não ter os monumentos de Roma, mas tem muita história, cultura e um grande apelo para quem está interessado em design”.
Só na semana do Salão do Móvel 2023, a paulistana organizou, pelo menos, um percurso temático por dia, individual ou em grupo. Durante o ano, ela chega a organizar 50 itinerários, todos estudados de acordo com a solicitação do cliente, na grande maioria brasileiros, e concebidos para durar de 2 a 4 horas. “Eu acabei apelidando de ‘fast tour’, pois, às vezes, o visitante não tem muito tempo e, além dos pontos clássicos, ele ainda quer encaixar na viagem algo de interesse pessoal”, explica a curadora de experiências, como Cyntia gosta de ser chamada.
Experiência e conhecimento é também o foco da arquiteta Francesca Grignaffini, 50 anos, que, desde 2015, passou a se dedicar ao turismo temático e, no ano passado, criou o projeto Greater Milan. “Organizo os tours de acordo com a paixão dos turistas, seja em Milão ou nos arredores. É claro que o design é o carro-chefe, seguido pela arquitetura. Só no ano passado, foram cerca de 100 roteiros”, explica ela, que atende um público muito variado e conta com uma equipe de guias em várias línguas, inclusive português. “Este ano, durante o Salão do Móvel, trabalhamos intensamente com profissionais da área que retornaram à cidade depois da pandemia. Nos concentramos em visitas de 3 horas e meia que podem ser feitas em grupo ou individualmente”.
História e curiosidades permeiam os roteiros organizados pela Vivendo Milão, da brasileira Cyntia Temer Massari. O turismo experiencial é amplo. Se o cliente quiser conhecer um pouco mais das obras dos arquitetos milaneses, ela oferece uma visita especial à famosa Villa Necchi Campiglio, projetada nos anos 1930, pelo arquiteto Piero Portaluppi. A mansão, localizada no centro de Milão, é de propriedade da FAI (Fondo Ambiente Italiano), uma organização que preserva o patrimônio artístico do país.
“Os quatro andares do casarão dão a sensação que a família Necchi Campiglio ainda viva lá. A cada andar, a cada cômodo, cada móvel ‘respira’ um pouco dos anos 1930. Os banheiros em mármore valem a visita bem com os espaços destinados aos quartos”, conta ela que faz todos os passeios pela cidade usando o transporte público ou a pé. “É uma visita inesquecível em uma Milão que esconde – não intencionalmente – grandes joias da arquitetura italiana”, completa.
Outra casa que desperta o entusiasmo dos turistas “temáticos” é o Museu Poldi Pezzoli, a poucos metros da Catedral do Duomo. “Há muitas obras de arte e móveis de grande valor, além de uma renomada coleção de joias antigas e relógios de época”, diz Francesca Grignaffini, da Greater Milan. Para quem gosta de design, a italiana sugere com frequência um tour que reverencia um dos grandes designers da cidade: Gio Ponti. “É o nosso carro-chefe. Este percurso é feito a pé e com o uso de transporte público. Começamos pela loja da Richard Ginori (marca líder em design, 100% Made in Italy há mais de 200 anos para itens de porcelana decorativas), onde é possível admirar a coleção de cerâmica desenhada por esse artista versátil, passamos pelo showroom da empresa de iluminação Artemide e finalizamos no arranha-céu Pirelli, conhecido também como Pirellone, máximo exemplo da sua arquitetura”.
Outro destino certo para os amantes do design e arquitetura são as instituições, galerias e um enorme número de lojas-conceito das principais marcas do “Made in Italy”, que mantêm peças importantes e representativas do design mundial e italiano. “A Concept Design, por exemplo, traz um pouco da vida de Vico Magistretti, um ícone do design industrial do século 20. O roteiro começa no seu estúdio-museu, criado para divulgar o seu trabalho com uma série de esboços, fotografias e anotações”, esclarece Francesca Grignaffini, que sucessivamente acompanha o grupo para ver de perto peças icônicas do italiano no showroom da De Padova/Boffi. “A visita é finalizada com um passeio para conhecer um de seus projetos arquitetônicos na Piazza San Marco, no bairro de Brera”.
O público eclético que vem para Milão em busca das origens do design italiano também se beneficia da oferta de itinerários gratuitos sugeridos pela prefeitura da cidade por meio do site YES MILANO. “Disponibilizamos inúmeras ideias para que o próprio turista monte o seu roteiro”, revela Luca Martinazzoli, diretor geral da Milano&Partners, agência dedicada à promoção da cidade. “O ADI Design Museum – Compasso d’Oro entra na lista dos locais propostos. É o maior museu de design da Europa, com um patrimônio de 2.300 peças icônicas de profissionais como Alessandro Mendini. Temos também a Fundação Castiglioni e a Fundação Vico Magistretti”.
Enquanto muitos querem se inteirar sobre o design italiano, há uma grande parcela de turistas que se interessa pela arquitetura. E nos últimos tempos, o assunto é sustentabilidade. A procura vem se intensificando e estimulou Cyntia Temer Massari, da Vivendo Milão, a criar um tour específico sobre o tema. “O roteiro Milão Sustentável é uma parceria minha com uma amiga, a Ana Carolina Cardoso. Levamos o turista para o bairro de Porta Nuova, do ladinho de Brera. Uma área revitalizada de 340 mil metros quadrados, um projeto de equilíbrio das arquiteturas existentes”, descreve a paulistana que, além de mostrar os novos edifícios submetidos a avaliações de sistemas de certificação ambiental, como LEED (Leadership in Energy and Environmental Design), ainda explica os critérios de sustentabilidade arquitetônica.
Um dos edifícios mais visitados é o condomínio residencial Bosco Verticale (Bosque Vertical), de 2014, do arquiteto Stefano Boeri, um exemplo de moradia vertical onde árvores e seres humanos convivem harmoniosamente. “Também passamos pela Torre Unipol, de Mario Cucinella, que ainda está em construção, mas dá uma ideia de como a arquitetura sustentável é o futuro da cidade”, comenta Cyntia, que mostra aos seus clientes o prédio de 124 metros que foi desenhado para respeitar as peculiaridades do contexto urbano e do clima. A obra é a última peça fundamental do bairro de Porta Nuova, que ganhou um projeto de requalificação urbano abrangente nos últimos anos que contribuiu para relançar a imagem de Milão como destino turístico para quem se interessa por arquitetura e design.
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Via Gazeta do Povo
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