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O Porto Maravilha e suas estratégias de Walkability

Publicado em 03 . 08 . 2016

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A poucos dias do início dos Jogos Olímpicos 2016, foi inaugurado o Boulevard do Porto Maravilha na zona central e portuária do Rio de Janeiro. O Boulevard é um espaço público de lazer que pretende resgatar a relação do centro da cidade com o mar, valorizar os novos equipamentos culturais criados na área, como o Museu de Arte do Rio (MAR) e o Museu do Amanhã, bem como se caracterizar como um marco da transformação ambiental promovida pela maior Operação Urbana já realizada no Brasil.
 

Figura 1 – Museu do Amanhã

 
A Operação Urbana Porto Maravilha, cuja Lei foi aprovada pela Prefeitura do Rio em 2009, tem por objetivo requalificar e adensar a zona portuária do Rio de Janeiro, de forma a reinseri-la na dinâmica urbana e torná-la economicamente produtiva para a cidade. O maior desafio do projeto foi, portanto, tornar o bairro atrativo principalmente para o uso residencial, sendo este o único capaz de promover ‘vida’ nos espaços públicos, tanto durante o dia como à noite.
Reconhecendo a importância da boa utilização dos espaços públicos abertos para a promoção da qualidade ambiental urbana, o projeto lançou mão de diversas estratégias de Walkability[1] no desenho urbano. Embora o projeto não tenha buscado a certificação LEED for Neighborhood Development (LEED ND), já que a requalificação das edificações não foi escopo de suas intervenções, diversos requisitos deste referencial técnico foram atendidos e podem ser observados nas obras já concluídas.
 
[1] Walkability é o termo em inglês que define o quanto um espaço é atrativo para o uso da caminhada, podendo também incluir outros meios de transportes leves/ativos, como é o caso da bicicleta. No Brasil, já se utiliza também o termo Pedestrianismo ou Caminhabilidade.
 

Figura 2 – Bulevar do Porto Maravilha/ Orla Conde

Além de incentivos dados para o estabelecimento de novos empreendimentos de uso misto na área, parte da verba arrecadada com a venda dos Certificados do Potencial Adicional de Construção (CEPAC) da Operação Urbana está sendo destinada à recuperação de diversos imóveis tombados, como é o caso do MAR e dos armazéns do Cais do Porto. Essa ação não só valoriza o patrimônio cultural da cidade, mas faz com que o conjunto arquitetônico contribua para a qualidade ambiental dos espaços públicos.
A rede de transportes que atendia a zona portuária foi incrementada com novos modais públicos, como o Veículo Leve sobre Trilho (VLT) e o Teleférico da Providência, que facilitaram o acesso aos morros da região. Foram previstas também ciclovias na maior parte das ruas do bairro e diversas estratégias foram implantadas com o objetivo de incentivar seus usuários na escolha da caminhada em vez do carro. Novas ruas foram abertas para aumentar a conectividade e a permeabilidade do bairro, e os novos empreendimentos estão sendo aprovados mediante a abertura dos pavimentos térreos para a fruição pública de pedestres, com a proposição de comércio, serviços e espaços de convívio dentro do lote.
 
Todas as calçadas do projeto também foram reformadas e arborizadas para promover conforto aos pedestres. O granito em módulos de 45×45 cm, por exemplo, foi o principal material utilizado nessa pavimentação, pois garante facilidade de manutenção das instalações subterrâneas, assim como conforto ergonômico e luminoso, já que sua cor é reflexiva o suficiente para não contribuir com o efeito ilha-de-calor nem causar ofuscamento visual ao pedestre.
Embora a Operação Urbana não conte com nenhum grande parque público, a demolição do Elevado da Perimetral na Av. Rodrigues Alves e sua substituição por um túnel possibilitaram a criação de um grande Boulevard, que conecta a zona portuária ao centro da cidade, denominado de Orla Conde. Além do mesmo tratamento recebido pelas calçadas do projeto, bancos, lixeiras e painéis informativos foram instalados para aumentar a qualidade dos espaços públicos e incentivar a sua apropriação pelas pessoas.
 

Figura 3 – Rebaixamento da Av. Rodrigues Alves para criação da Orla Conde

As obras de infraestrutura do projeto Porto Maravilha foram concluídas e, provavelmente, muitas delas contribuirão para o desenvolvimento sustentável da cidade do Rio de Janeiro. É importante lembrarmos, no entanto, que um bairro torna-se admirado por seus usuários não somente pela sua característica física, mas sim pelo quanto eles irão se reconhecer naquele espaço e se identificar com as dinâmicas que ali ocorrem. Desta forma, serão necessários ainda alguns anos, ou até décadas, para que se estabeleçam essas novas dinâmicas e se possa avaliar, portanto, os resultados gerados pelo projeto.
Hoje podemos considerar como grande aprendizagem, a partir dessa nova e importante experiência urbanística brasileira, a necessidade de haver políticas públicas e projetos urbanos focados na criação de espaços humanizados, em que a cidade não é o resultado da somatória de espaços privados, mas sim o resultado de bons espaços públicos conectados e saudáveis, que sirvam de palco para a interação e o desenvolvimento da população.
 
Texto escrito pela Myriam Tschiptschin, arquiteta e urbanista formada e pós-graduada pela FAU-USP. Lidera o Núcleo de Urbanismo do Centro de Tecnologia de Edificações (CTE) e será palestrante no segundo dia do Greenbuilding Brasil Conferência Internacional & Expo. 

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