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Procknor, do Mattos Filho: abraçar pauta ESG exige coragem dos líderes — Foto: Divulgação

 

O avanço da adoção de práticas ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês) pelas empresas gerou, nos últimos anos, uma alta demanda por serviços jurídicos relacionados ao tema em áreas que vão desde a societária a questões trabalhistas. Se, por um lado, muitos escritórios se adaptaram para ter times multidisciplinares a fim de ofertar novos serviços, por outro, as próprias bancas foram obrigadas a olhar da porta para dentro e aplicar internamente esses princípios. E enfrentam os mesmos desafios de seus clientes para evoluir em ESG.

Para traçar planos estratégicos, as diretrizes dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas e a Ambição 2030 do Pacto Global da ONU no Brasil ajudam na pauta. Por estarem em um setor de serviços, o social é um dos pilares mais relevantes para as bancas. Equidade, diversidade e inclusão são assuntos mais encaminhados, enquanto a saúde mental dos funcionários é um terreno ainda pouco explorado.

Em maior ou menor grau, os escritórios estão atualizando sua política de contratações para promover equidades de gênero, racial e etária. Nas grandes bancas não é incomum ver metade do quadro formado por mulheres. Mas a maioria ainda engatinha na equidade, na alta liderança e na participação de negros.

Lee, do LBCA: escritório é um dos poucos com profissionais trans e refugiados — Foto: Divulgação

 

“Conseguimos certo equilíbrio: no grupo de governança do escritório, somos sete sócios eleitos, quatro homens e três mulheres. Já entre os colaboradores (1.028 no total), 59% se identificam com o gênero feminino e 41% masculino”, relata Tito Andrade, sócio do Machado Meyer Advogados. O grupo tem ainda grupos de afinidade, como LGBTQIA+ e de raça.

Na fronteira entre diversidade e governança, o Pinheiro Neto, por exemplo, além de ter 50% de colaboradores do sexo feminino, conseguiu chegar à remuneração 100% igualitária entre mulheres e homens que ocupam cargos semelhantes. O escritório criou uma Comissão da Mulher, que atua para reter e promover os talentos femininos, promovendo, por exemplo, mentorias de desenvolvimento de carreira com associadas.

O escritório Lee, Brock, Camargo Advogados (LBCA) já têm desde 2017 políticas de contratação de grupos minorizados e minorias. Segundo Yun Ki Lee, sócio-fundador, os sócios começaram a se mexer quando clientes internacionais passaram a pedir serviços na temática e, ao mesmo tempo, cobrar de fornecedores e parceiros que fizessem o mesmo. Desde então, Lee estuda e traz ao comitê de diversidade e inclusão, criado em 2018, benchmarks globais em diversas frentes para as práticas serem estudadas e, o que fizer sentido, implementadas.

O que não consegue avançar naturalmente, busca de forma ativa, com apoio de ONGs e outras parcerias, como é o caso de profissionais pretos e trans. Foi um dos primeiros a ter um advogado trans e mantém parceria com a TransEmpregos para atrair mais talentos.

Não à toa, o LBCA exibe um dos percentuais mais altos do mercado de participação feminina: 66% do total de pessoas no escritório (746). “Entramos para o Movimento Elas Lideram 2030 da ONU e Pacto Global e definimos uma meta de ter 20% de mulheres na liderança até 2022. Hoje, temos 35% considerando advogadas-sócias e diretoras”, comenta Patrícia Blumberg, diretora de ESG da LBCA. De acordo com o último censo, também somaram 30% de pretos e 9% de profissionais que declararam pertencer ao grupo de LGBTQIA+. Outra frente é a contratação de refugiados.

O programa Diversidade, Equidade & Inclusão do Mattos Filho recebeu, em 2021, o prêmio Joan Guggenheimer, concedido pela JPMorgan Chase para firmas de advocacia. As ações de gênero começaram em 2015 e hoje são 15 iniciativas em curso nesta e outras frentes, entre elas o Soma talentos, que destina uma cota de vagas exclusivas à contratação de estagiários negros e está na quarta edição.

O BMA Advogados, mantém, entre outros programas, o Incluir Direito, pelo qual são ofertadas bolsas de estudo integrais para que estagiários façam cursos de inglês e, assim, melhorem sua capacitação. O escritório também se comprometeu com a temática de erradicação da pobreza e dá suporte a iniciativas de distribuição de alimentos em parceria com a ONG Gastromotiva, entre outras ações no âmbito social.

Em governança, a busca dos escritórios é por políticas mais transparentes de remuneração e promoção. O Machado Meyer tem sessões periódicas com funcionários para tirar dúvidas sobre plano de carreira e políticas de remuneração, e incorporou no processo de avaliação algumas reuniões de “calibração” em que participam líderes e o RH para comparar e justificar as notas aplicadas às pessoas — a ideia é garantir equidade e justiça no processo. Também abre para toda a empresa se candidatar para participar da comissão de PPR (Programa de Participação nos Resultados) que, durante o ano, discute e analisa possíveis mudanças e atualizações no programa.

Em saúde mental, algumas bancas já oferecem suporte psicológico 24 horas por dia. Também promovem atividades de saúde física, oferecem treinamentos, canais de ouvidoria interna, palestras com temas como comunicação não violenta, gestão do tempo, vieses inconscientes, diversidade e liderança.

Práticas ambientais

Nas questões ambientais, alguns escritórios já contrataram consultorias para fazer seu inventário de emissão de gases de efeito estufa (GEE) e um plano de compensação. O Pinheiro Neto, por exemplo, já faz compensação de emissões de carbono há 15 anos por reconstituição de floresta nativa do bioma Mata Atlântica. Foram mais de 80 hectares por meio do plantio, manutenção e monitoramento de mais de 127 mil árvores nativas.

“No setor de serviços, a contribuição ambiental é ligada ao controle dos fornecedores. São tópicos como energia, aproveitamento de água, refração da luz solar e redução de consumo de ar condicionado. Além de olhar essas frentes, queremos oferecer estrutura para quem quiser vir de bicicleta, por exemplo, e até trazer sua alimentação mais saudável”, comenta Lee, do LBCA. A banca vai publicar a primeira edição do inventário em seu relatório de sustentabilidade deste ano.

Para cuidar da coleta e destinação correta dos resíduos, o Mattos Filho fez parceria com a cooperativa Yougreen, além de promover a reciclagem de materiais. A banca é membro da Net Zero Lawyers Alliance, que une escritórios no mundo comprometidos com a sustentabilidade para zerar a emissão poluentes até 2050.

Os edifícios também contam bastante. O BMA Advogados ocupa prédios no Rio e em São Paulo certificados com o selo LEED Gold, que atendem a requisitos mínimos de sustentabilidade. Com isso e mudanças internas, a unidade no Rio, por exemplo, conseguiu diminuir em 86,5% o consumo mensal de energia nos últimos anos, passando de 973.223 quilowatts-hora (kWh) de consumo em 2017 para 131.379 kWh em julho deste ano. Em São Paulo, diminuiu em 63% no mesmo período. O que ajudou também foi a instalação de sensores de presença nos andares, que regulam a luz.

O foco em prédios mais sustentáveis levou o Machado Meyer até a mudar de endereço em São Paulo. No novo, a iluminação é de LED e as divisórias de vidro possibilitam menos luzes ligadas. O sistema de ar-condicionado foi escolhido para ser mais eficaz e ficar menos tempo funcionando. Além de sensores de presença nos halls e escadas, também passaram a deixar os equipamentos multimídia das salas de reuniões em função “standby”. Com isso, o consumo de energia caiu em quase 50% no andar de reuniões, por exemplo.

Outra frente comum entre as bancas é a digitalização de documentos e bibliotecas. Já as viagens, antes da pandemia algo frequente, deram lugar a reuniões virtuais, ajudando também a reduzir emissões.

Para Marina Procknor, do escritório Mattos Filho, abraçar a pauta ESG exige, em resumo, “coragem dos líderes” para estabelecer melhores propósitos e valores. “As companhias bem-sucedidas na transição de um modelo de negócio tradicional para o sustentável aceitam o desafio de transformar a cultura em todas as dimensões da organização”, pontua. De acordo com ela, a peça-chave dessa guinada é a inovação: nos processos produtivos e nas relações com stakeholders, tendo como meta a economia circular, que elimina o lixo, e também nas políticas anticorrupção, de privacidade e proteção de dados. “E é preciso assegurar, com as políticas de diversidade e inclusão, que talentos representantes de todos os setores da sociedade façam parte da organização e da liderança.”

A Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP) iniciou em 2020 o desenvolvimento de políticas voltadas para temática. A entidade mantém cinco comissões permanentes de trabalho que promovem reuniões periódicas e estabelecem planos de ação integrada em questões de direitos humanos, governança e integridade, igualdade racial, meio ambiente e mulher advogada. “Queremos engajar a classe, fomentando as boas práticas”, diz Rosa Ramos, presidente da comissão de Meio Ambiente.

 

 

Via Valor Econômico

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