Preservação da biodiversidade, eficiência energética e redução dos gases de efeito estufa se tornam uma alternativa para expandir os negócios e acessar recursos
A adoção de práticas sustentáveis se tornou essencial para abrir mercados e facilitar o acesso a capitais. Levantamento do Centro de Tecnologia de Edificações (CTE), feito em dezembro do ano passado em parceria com a Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), mostra que a agenda ESG integra a pauta dos investidores e líderes do setor da construção civil. Das 27 empresas do segmento consultadas, 71% declararam que cumprem diversas ações de ESG (sigla em inglês para sustentabilidade ambiental, social e de governança corporativa) e outras 29% estão em fase inicial de implementação.
Temas como a preservação da biodiversidade, eficiência energética e metas de redução dos gases de efeito estufa (GEE) estão entre os determinantes para os negócios. “As empresas também estão sendo incentivadas a adotar práticas transparentes, éticas e responsáveis na gestão”, ressalta o presidente da Abrainc, Luiz França.
Um exemplo do casamento entre o acesso a recursos e as boas práticas é a Direcional Engenharia. A construtora realizou, no ano passado, sua primeira emissão de títulos de dívida com rotulagem social, recebida de parecer independente e alinhada a diversos temas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). Captou R$ 300 milhões, que serão investidos em habitações para as faixas 1 e 2 do programa federal Minha Casa, Minha Vida.
“Temos um processo construtivo de grande relevância do ponto de vista da sustentabilidade. Os projetos contemplam soluções de uso eficiente de água e energia tanto em áreas comuns quanto em apartamentos”, comenta Paulo Sousa, diretor de relações com investidores.
A Direcional tem obtido redução de cerca de 85% no volume de resíduos em seus canteiros, em comparação ao método tradicional de alvenaria estrutural, graças às formas de alumínio usadas como moldes para fazer as moradias. “Isso proporciona agilidade, eficiência das equipes, que podem ser treinadas localmente, e valor ambiental”, observa o executivo
Outra que tem os olhos abertos para a necessidade de abraçar práticas sustentáveis é a Tenda. Embora ainda esteja engatinhando nesse processo, mantendo ações básicas, criou em 2021 uma divisão mais “verde”, de casas pré-fabricadas. Trata-se da Alea, que usa a tecnologia “wood frame” para a produção de painéis de madeira de reflorestamento, utilizando esses materiais para fazer as estruturas da casa.
As paredes e partes do telhado são produzidas na unidade fabril, em Jaguariúna (SP), e transportadas para os canteiros das obras apenas para montagem e acabamento. “Estima-se que uma habitação de ‘wood frame’ reduza em 15 toneladas a pegada de carbono de uma casa de parede de concreto”, diz Alex Hamada, diretor administrativo da Alea. A empresa, que começou no interior de São Paulo, está chegando a Minas Gerais e ao Paraná.
Nilson Sarti, presidente da comissão de meio ambiente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), observa que as construções com madeira são uma tendência do setor. “Sequestram carbono em vez de emitir, e isso representa um ganho global de uma prática que deve ser ainda mais incentivada”, avalia.
Se o objetivo é fazer moradias cada vez mais verdes, a incorporadora e construtora Capitânia está bem-posicionada. Ganhou, com o prédio residencial IDEA Bagé, inaugurado em 2022, em Porto Alegre, o selo máximo do GBC Brasil (integrante do Word Green Building Council), cujo papel é estimular a sustentabilidade na construção civil brasileira.
Com 14 unidades, o IDEA Bagé tem energia fotovoltaica para 100% do consumo nas áreas condominiais e de 30% dos apartamentos, além de vidros e fachadas que amenizam as necessidades de energia. Usa materiais sustentáveis e equipamentos para economizar água, entre outras iniciativas. Foi o primeiro prédio do país a receber o reconhecimento máximo de edifício “verde”.
“Os itens de sustentabilidade acrescentaram cerca de 8% ao custo”, conta o sócio da Capitânia, Mauro Touguinha. Segundo ele, os preços de venda têm sido os mesmos de um prédio comum. O IDEA Bagé é um conceito de empreendimento sustentável criado pela Capitânia, que planeja concluir outro do gênero no fim deste ano e mais um em 2025. Todos em Porto Alegre.
Processos produtivos aliados a tecnologias limpas estão também na cadeia de suprimentos da construção civil. A Votorantim Cimentos, por exemplo, assinou, em julho passado, financiamento de US$ 150 milhões vinculado a indicadores de sustentabilidade com a International Finance Corporation (IFC), do Banco Mundial.
Os recursos servirão para reduzir as emissões da fábrica de Salto de Pirapora (SP). “Com esse projeto, a unidade deve dobrar a capacidade de utilização de combustível alternativo”, diz Álvaro Lorenz, diretor global de sustentabilidade e relações institucionais da Votorantim Cimentos. Essa expansão fica pronta até 2028.
Em 2022, a empresa reviu sua meta de descarbonização, que agora é de 475 kg de CO2 por tonelada de cimento até 2030. Esse volume é 8,7% menor do que a meta anterior, anunciada em 2020. A ambição é chegar a 2050 com uma produção neutra em carbono.
Para isso, a Votorantim Cimentos opera com coprocessamento, substituindo combustível fóssil por biomassas e diversos resíduos, e utiliza subprodutos de outros processos produtivos, reduzindo a proporção de clínquer – intermediário do cimento. Dessa forma, diminui suas emissões de CO2 na atmosfera. Há também o uso de fontes renováveis de energia.
O presidente do Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (SNIC) e da Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP), Paulo Camillo Penna, destaca que o setor está engajado na descarbonização. Quer chegar a 2050 com taxa de 55% no uso de combustíveis alternativos e pretende investir cerca de R$ 3,5 bilhões até 2030, apenas para usar resíduos sólidos urbanos – fração não reciclável – como fonte de energia.
Outro objetivo é diminuir em 33% a emissão, ao mesmo tempo em que se espera alta de 70% na produção de cimento até 2050. “A agenda de carbono é o maior e mais importante compromisso com o meio ambiente já firmado pela indústria do cimento”, ressalta Penna.
Por Simone Goldberg
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Via Valor Econômico
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