Há mais de um século, o futuro aquecimento global a partir da queima de combustíveis fósseis já era um alerta do sueco Svante Arrhenius, Nobel em química (1903), mas foi praticamente ignorado. Desastres ambientais e alterações climáticas com que vimos nos familiarizando são decorrentes da mesma abstração da realidade.
A curva de emissões de CO2 permanece em crescimento exponencial – embora os desdobramentos ao redor do mundo, desde os anos 60, reunindo instituições inclinadas a buscar meios de salvaguardar as sociedades que elas representam e o planeta.
Derivadas dessas medidas que conselhos, conferências, fóruns, agendas vêm elencando, as certificações ambientais contribuem para atrair as atenções para o que nesse contexto é considerado como boas práticas e dessa forma promover a sensibilização e o engajamento da sociedade.
Estamos distantes de uma conscientização coletiva, mas é preciso perseverar.
Nesse arcabouço de valores, insatisfeita com as práticas profissionais convencionais de 17 anos de carreira em projetos de arquitetura e execução de obras, me voltei ao conceito da sustentabilidade a partir de novas formações – pós-graduação mais certificação como especialista e consultora em arquitetura sustentável e bioecológica ANAB-IBN (2012), quando constituí nova empresa, a Cedro Sustentabilidade e Execuções – e mais recentemente mestrado em ensino das ciências ambientais USP-PROFCIAMB (2021) com a dissertação “O espaço escolar sustentável como educador” e o produto “Guia de Princípios da Escola Sustentável”, trabalhos voltados à educação ambiental e ao alinhamento de espaços escolares ao conceito.
Desde 2011 trabalho exclusivamente pelo viés da sustentabilidade. Projetos sob a visão da abrangência sistêmica para reformas, construções, planejamentos, intervenções, sejam para residências, estabelecimentos comerciais, empresariais ou escolas. Desenvolvi metodologia própria para viabilizar meu trabalho em projeto e gestão executiva junto a todos os stakeholders. Meu trabalho passou a realmente fazer sentido para mim. O novo formato individual e em rede, idem. Os desafios do ofício são os mesmos, mas agora me realizo, como profissional e indivíduo, uma vez que muitos são influenciados pelo conceito. Questionamentos acerca dos avanços da sustentabilidade, porém, ainda também perduram:
São muitas as perguntas e não temos respostas definitivas, mas sabemos que o consumo é o alvo dos problemas por ele irradiados sobre o planeta e sociedade.
Assim surgiu o propósito de experimentar realizar uma obra própria onde a abrangência da sustentabilidade promovesse liberdade de projeto e dos paradigmas estabelecidos pelo mercado.
A MoradaYDU, mais que uma casa ecológica, é um projeto de vida de uma família que busca fazer a transição de seus próprios hábitos e condutas para um cenário de sustentabilidade real, envolvendo soluções e propósitos nas áreas ambiental, social e econômica por meio de ações e escolhas que convirjam com o conceito, evitem modelos padronizados e sensibilizem a sociedade.
A obra é um manifesto ativista por meio da arquitetura – seja pela sensibilização ambiental, pela bioclimática aplicada, pelo apelo à redução de consumo ou pela educação informal a todos que a visitam. Traz amplo repertório de habilidades aliadas a técnicas bioclimáticas e bioecológicas, que conjugadas com materiais – de passivos ambientais à sistemas construtivos a seco – encontrados no mercado local ou próximos, proporcionam conforto e bem-estar de forma passiva, aliando funcionalidade ao conforto, elegância ao design aplicado, durabilidade à baixa manutenção.
São traços que, ao perseguirem a minimização do consumo de recursos naturais, a geração de resíduos e os descartes próximos à zero, o beneficiamento do bioma e sociedade locais, a autonomia em saneamento e energia, promoveram um rico desafio sistêmico.Ao conquistar este selo, a obra convida a uma observação atenta ao que pode estar por trás de uma edificação Zero Energy, muito além do bom dimensionamento de uma usina fotovoltaica. A obra incorpora 9 ODS da Agenda 2030, num complexo de soluções e experiências dentro do conceito.
Destacam-se perante a certificação Zero Energy, em específico, recursos passivos bioclimáticos empregados tanto para promover saúde e bem-estar como economia de energia:
Estamos morando na casa há 1 ano e 9 meses e nesse pós-ocupação posso dizer que há uma verdadeira transição das nossas condutas, como já era previsto e pretendido. Mesmo possuindo hábitos conscientes antigos dentro do conceito da sustentabilidade, nos vemos continuamente surpresos com a nossa reaproximação da natureza dia após dia e de seus recursos disponíveis continuadamente, graças às soluções passivas bioclimáticas, bioecológicas e paisagísticas empregadas. Estamos assimilando que somos parte dela e se nos aprimorarmos em observá-la em sua inteligência e reaprender a fluir nessa sintonia, diversos processos onerosos, sobretudo ao planeta, se tornarão dispensáveis. O conceito de “conforto” se amplia, ainda que passemos a viver fora da “zona de conforto” do consumo e de tantas facilidades mecânicas artificiais.
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por Yara Santucci Barreto, especialista e consultora ANAB-IBN* em arquitetura sustentável e bioecológica e mestre em ensino das ciências ambientais. É formada em arquitetura e urbanismo e diretora da CEDRO Sustentabilidade e Soluções.
* https://www.anab.it | https://baubiologie.de | https://www.moradaydu.com/