Ao final de janeiro de 2017, pensando neste artigo que trata do mercado imobiliário que esperamos para este ano, imaginei o quanto é difícil fazer qualquer previsão neste País, pois ainda existem “fantasmas” rondando nossa política e a economia, sem dúvida nenhuma, o principal deles se chama Operação Lava Jato.
Deixando de lado esse fato, me socorri da memória recente, relembrando o caminho que a indústria da construção civil imobiliária percorreu nos últimos 15 anos. No início do século XXI (2001/2004) praticamente não existia financiamento imobiliário, porque os bancos usavam as prerrogativas possíveis para não correr riscos e para melhorar a rentabilidade dos seus acionistas, com a não aplicação dos recursos da caderneta de poupança. O ano de 2004 foi auspicioso para o nosso mercado com a aprovação da Lei 10.931/04, verdadeira colcha de retalhos, que dispôs um marco regulatório para o setor imobiliário por meio da criação do Patrimônio de Afetação, do Regime Especial Tributário, da Consolidação da Alienação Fiduciária e da Retificação Administrativa de Áreas, somente lembrando dos principais pontos.
Também, nossa economia no primeiro governo Lula, atravessava um período de crescimento constante, altamente influenciado pela economia mundial, forte elevação dos preços de commodities agrícolas e minerais e demanda da China. De 2005 a 2007, mais de 20 incorporadoras imobiliárias, empresas de intermediação e shopping centers, abriram seu capital obtendo êxito na captação de recursos do mercado de capitais, iniciando um processo alucinante de nacionalização e interiorização do mercado imobiliário. Este processo foi logo interrompido no segundo semestre de 2008, após a quebra do Leman Brothers e de inúmeros bancos na América e na Europa.
Foi quando surgiu, em 2009, o programa Minha Casa Minha Vida, verdadeira alavanca do mercado imobiliário dos últimos oito anos. As empresas do segmento imobiliário, de todos os portes, passaram a desenvolver produtos destinados às diversas faixas do programa e o mercado imobiliário deslanchou em 2010, enquanto o PIB do Brasil cresceu 7,5% e foram criados mais de 2,2 milhões de novos empregos com carteira assinada, segundo dados do CAGED.
Costumo afirmar que o MCMV à época, mereceu nota 10, isto por que o governo, ao debater a criação do programa, solicitou aos interlocutores públicos e privados que “não inventassem a roda” e simplesmente adequassem as linhas de financiamento existentes às necessidades das classes de renda mais baixa. Assim foi feito e ainda em 2009, mas principalmente a partir de 2010, o mercado imobiliário teve no MCMV um potencializador sem precedentes para o desenvolvimento de todas as faixas de imóveis ofertados no País.
Pena que o governo, como sempre acontece, é demorado na adequação dos parâmetros do programa que foram revistos, pela primeira vez somente em 2012, daí uma nota 8 para a segunda fase do MCMV. Já em 2015, no lançamento da fase 3 do programa, a nota é 6, esclarecendo aos mais afoitos que as notas não se referem absolutamente à altíssima importância que o programa tem para o mercado imobiliário, e sim à aderência de seus parâmetros (preços, subsídios e renda familiar) à demanda, que era quase perfeita em 2009 e foi reduzindo o poder de compra das famílias no decorrer dos anos.
De qualquer forma o programa Minha Casa Minha Vida contratou até 2016 aproximadamente 4,5 milhões de unidades das quais mais de 3,1 milhões já haviam sido entregues e promete, em 2017, contratar mais de 500mil unidades em suas diversas faixas, o que por si só, dá a dimensão de sua importância para os incorporadores imobiliários e construtores de todos os tamanhos, mormente àqueles de médio e pequeno portes.
Agora, falando sobre crédito imobiliário, que até 2013 teve período de crescimento exponencial e atingiu seu pico em 2013 com mais de 1 milhão de operações/ano. Em 2014 o crescimento estabilizou e nos anos seguintes experimentou sensível redução em suas operações, mormente àquelas financiadas pela caderneta de poupança. Se em 2013 o Sistema Financeiro da Habitação, composto pelos recursos do FGTS e do SBPE chegaram a financiar mais de R$150bilhões, em 2016 segundo dados disponíveis, o crédito imobiliário consumiu R$111bilhões.
Mesmo assim, esses números só foram possíveis, porque o FGTS apesar dos ataques sofridos de todos os lados, a partir de 2015 vem aplicando em Habitação Popular recursos acima dos valores financiados pela caderneta de poupança. Não foram poucas as iniciativas do Conselho Curador do FGTS em socorro da construção civil imobiliária, com decisões que atenuaram as dificuldades de demanda que o segmento atravessou a partir de 2014.
Sem medo de errar e antes de passar a tratar do futuro, cabe aqui uma afirmativa: o Sistema Financeiro do País, seus fundos (FGTS e SBPE) e seus agentes financeiros, continuam tendo uma saúde invejável em termos de retorno e de qualidade da carteira, o que resulta em baixos níveis de inadimplência. Hoje o crédito imobiliário concedido às pessoas físicas é o maior e melhor entre todas modalidades disponíveis no Sistema Financeiro Nacional. Não encontraremos em outros países sistema de crédito imobiliário mais saudável que o nosso, mesmo considerando que nossa economia desce ladeira abaixo há três anos.
O mercado imobiliário, como o restante dos segmentos, tem forte correlação com as idas e vindas da economia e com a variação do PIB do País e, sendo assim, após atingir seu auge entre os anos de 2012/2013, vem diminuindo sua oferta desde 2014 e, provavelmente tenha atingido o “fundo do poço” no ano passado. Segundo dados coletados pela Comissão da Indústria Imobiliária da CBIC até setembro passado, nos maiores mercados do Brasil a queda dos lançamentos em unidades atingia 31% em relação ao ano anterior e as vendas 15% na mesma comparação.
Porém, temos motivos para acreditar em uma melhora a partir de 2017, se considerarmos pelo menos o seguinte: i – o novo governo, além de conseguir aprovar o teto dos gastos públicos pelos próximos 20 anos, encaminhou ao Congresso Nacional a tão sonhada reforma da previdência e outras medidas de impacto, devolvendo parte da confiança dos empresários e da população em geral; ii – a inflação está sob controle, fechou 2016 próximo do teto da meta e tende à meta de 4,5% no final de 2017. Como efeito direto, os juros de longo prazo caíram perto de 30% em relação às taxas praticadas no ano passado e continuarão nesta tendência de queda; iii – a meta da taxa Selic para o final do ano é de 10% (pouco para mais ou pouco para menos), o que devolverá atratividade às cadernetas de poupança, injetará recursos nos financiamentos do SFH e promoverá, novamente, redução nas taxas de juros como ocorrido na década passada; e iv – para o segundo semestre está prevista a redução da taxa de desemprego e, se tudo correr como esperado, as empresas voltarão a contratar.
Além disso, o governo Temer entendeu desde seu início, a importância que a construção civil imobiliária tem na geração do emprego, da renda e de tributos e prepara para este mês de fevereiro uma série de medidas de incentivo para o setor, das quais destacamos, mais uma vez, a necessária adequação dos parâmetros (preços, subsídios e renda familiar) praticados nas faixas 1 e meio, 2 e 3 do programa Minha Casa Minha Vida. Novamente contaremos com a alavancagem do programa para retomarmos o mercado imobiliário. Também, já sentimos o retorno dos compradores de imóveis destinados às classes média alta e alta em algumas cidades brasileiras, tendência quer deve crescer junto com a queda da taxa SELIC e a, mesmo que vagarosa, melhoria da economia.
Porém, há muito o que fazer no ambiente de negócios para o setor imobiliário. Vimos trabalhando, incansavelmente, com governo
e órgãos de defesa do consumidor para estancar um dos legados mais nefastos desta queda recente do mercado imobiliário: os distratos. Nossos compromissos de venda e compra, apesar de irretratáveis e irrevogáveis, graças as decisões impensadas dos juízos de primeira instância, se tornaram verdadeiras opções de compra, sem que para tanto os compradores paguem algum preço para ter esta opção.
Outra preocupação são recentes decisões em todas as instâncias, sobre o rito da execução extrajudicial da alienação fiduciária, colocando em risco a solidez deste instituto. O País tem de preservar e aprimorar a alienação fiduciária enquanto garantia imobiliária, evitando assim que ocorra com ela o mesmo que aconteceu com a garantia hipotecária em décadas passadas e que resultou na concessão de crédito imobiliário nos mais baixos níveis desde sua criação em 1964. Estamos trabalhando este tema, juntamente com o governo federal e a Abecip.
Finalizando, estou otimista com a retomada do mercado imobiliário a partir de 2017. Nada comparado com a velocidade que tivemos no passado, porém, a oferta deverá crescer em torno de 10% a 15% neste ano no decorrer dos trimestres. Mais do que isso, as empresas da construção civil imobiliária já se mostraram preparadas e prontas para enfrentar um crescimento sustentável nos
próximos dez anos, pois sem dúvida nenhuma, teremos demanda de 15 milhões de novos domicílios até 2025 e um déficit habitacional de mais de seis milhões de unidades a ser combatido.
Texto escrito por:
Celso Luiz Petrucci, economista-chefe do Secovi São Paulo, membro da Comissão da Indústria Imobiliária da CBIC, especializado em crédito imobiliário e mercado.
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